Bernardo Caprara
Sociólogo e Professor
No domingo, dia dos professores, meu nono ano como professor, perto das 
oito horas da noite o interfone de casa tocou. Por sorte, naquele 
momento, eu não estava na sacada, perto da brasa, das carnes e dos 
legumes; também não estava perto do samba que rolava no quarto, 
festejando o aniversário de uma pessoa muito amada. Quando atendi o 
interfone, um rapaz queria deixar um ingresso para uma amiga. Peguei uma
 cerveja e abri a porta. Durante alguns segundos, enquanto aquele jovem
 cabeludo subia as escadas e chegava à minha porta, não acreditei no que
 via. Tinha bem à minha frente um dos alunos mais queridos, inteligentes
 e sensíveis para quem tive o prazer de lecionar. Encontrar o jovem 
poeta e escritor na minha casa, num domingo de pura alegria, muitos anos
 depois, de algum jeito me levou de volta para a sala de aula da escola 
que eu e ele e muitos outros fazíamos acontecer juntos, dia após dia. Em
 tempos tão difíceis, tempos de precarização da profissão docente, 
seduções autoritárias e intensificação das desigualdades, sorrir outra 
vez com aquele garoto foi como um reencontro comigo mesmo: ser 
professor, buscar o brilho nos olhos, insistir na sensibilidade, nas 
relações e no conhecimento – tudo isso ainda vale a pena.
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