Bernardo Caprara
Sociólogo e Professor
Passadas as eleições, a política ficou. Cheia de ódio, mas ficou. Há, pelo menos, quatro tipos-ideais de discursos que tentam dizer qual é a verdade sobre a sociedade brasileira. Primeiro, os mais radicais.
1) O Brasil é uma ditadura comunista em curso, metendo a mão na liberdade das pessoas. Vai virar Cuba e não podemos deixar isso acontecer. Os militares precisam agir. As políticas sociais do governo demonstram isso e a corrupção também. Fomentam a alegria dos vagabundos, das putas e dos gays. A democracia é uma farsa. Lobão é o líder redentor e a revista Veja o bastião da liberdade de imprensa. Ordem já!
2) As políticas sociais do governo são assistencialistas e não mudam a estrutura política e econômica do país. Há um crescimento do consumo das classes populares, mas não uma diminuição das desigualdades, pois os ricos estão cada vez mais ricos. O Estado brasileiro é autoritário e o governo reeleito não tocou na fonte desse autoritarismo em 12 anos. Pelo contrário, aprofundou esse cenário, como junho de 2013 demonstrou. Não há avanços significativos. A democracia é uma farsa. É preciso derrubar ou reconstruir o sistema.
Ambos os discursos batem no PT, de maneiras muito distintas, é óbvio. O PT é o epicentro da disputa pela verdade nacional. Vamos aos moderados.
3) O PT está desorganizando a economia e incentivando mecanismos institucionais autoritários. Não consegue pensar na combinação entre livre mercado e políticas sociais, porque está mergulhado em ideologias ultrapassadas. Está aparelhando o Estado e minando a democracia. A alternância do poder é necessária, mas não se deve pensar em golpe. A via da política institucional deve ser mantida e fortalecida, o que não impede denúncias e críticas ao PT. O PT é o alvo, pois os radicais pró-militares são minorias ridicularizadas pela nação. Prega-se um Estado mínimo e eficiente, com políticas sociais.
4) O Estado brasileiro vem sendo saqueado há séculos. O PT não modificou o modus operandi da política brasileira, apenas criou e fortaleceu políticas sociais importantes, que fizeram as classes populares darem um salto no que tange às oportunidades de ascensão social. É preciso pressionar o PT para que essas conquistas sejam aprofundadas, para que a democracia seja aprofundada. É preciso rejeitar os vícios autoritários do PT e estimular uma maior participação popular, consolidando as vias institucionais. É preciso combater os golpistas e sustentar os procedimentos democráticos como ponto de partida para um aprofundamento do combate às desigualdades e em prol dos direitos humanos. Essas pressões têm mais chances de ocorrer com o PT no governo do que com os demais partidos da ordem.
A coisa é mais complexa, eu sei. Mas esses argumentos estão por aí. Entrelaçados ou separados. E então, como pensar a realidade brasileira? Há mais perigo com o PT instrumentalizando o Estado com seu viés dito estalinista? Há mais perigo no saudosismo das ditaduras militares, cada vez mais presente? Não há perigo, há de se disputar os rumos numa democracia que já está consolidada?
As hipóteses de resposta, de minha parte, ficam para outra ocasião.
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