ABORDAGEM ARTESANAL, CRÍTICA E PLURAL / ANO 16

América do Sul, Brasil,

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Um cemitério de latas

Bernardo Caprara
Sociólogo e Jornalista

O sol brilhava e esquentava o dia. Estava lá para apoiar uma pessoa que conhecia havia pouco tempo, mas dera tantos sinais de que merecia a ajuda, que ele tinha certeza que fazia a coisa certa. Em meio a muito pó, o depósito de veículos do governo estadual tinha um aspecto deteriorado. A missão era tirar o carro dali.

O automóvel estava legalmente no seu nome, mas há muito já não lhe pertencia. No decorrer do processo de transferência aconteceu o furto, fato que o fez parar lá, no local que mais parecia um cemitério de latas. Passaram ambos por uma porta enferrujada, sob a ordem de que apenas um poderia entrar. Tudo funcionava estranhamente. Entraram os dois. Chegaram ao carro e, então, as previsões se tornaram realidade: sobraram somente a carcaça e o motor fabricado nos idos de 1989.

Observaram atônitos, banhados pela quentura solar dos tristes trópicos. Atrás do banco do motorista, duas ferramentas atiradas davam os tons do prejuízo que o rapaz que ele fora auxiliar teria pela frente. Só que representavam mais do que isso. Representavam a desconfiança de que o ganancioso sistema de crimes, corrupções e ilegalidades envolvendo veículos automotores estava ali, evidenciado diante deles. Funcionários do depósito depenam ao máximo o fruto do desejo alheio, enquanto os dois (!) trabalhadores da perícia atendem ao enorme número de ocorrências diárias em toda a capital. Depois liberam o carro. A cena está pronta. E assim essa espécie de “máfia” segue ferindo o sonho dos outros.

Ele se foi, suado, pensando nos detalhes que fizeram com que o ideário da razão iluminista (igualdade, liberdade e fraternidade) perdesse o embate para a “mão direita” da modernidade. O núcleo duro das relações econômicas capitalistas, da procura incessante pelo lucro, do culto ao indivíduo que produziu seu sucesso sozinho, elementos que parecem vencer as belezas das utopias da humanidade. O final, este a gente ainda desconhece. O final desta historieta, entretanto, tem um gosto amargo indescritível.

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quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Desprovincializando a sociologia?


Os debates que giram em torno das possibilidades de lugares híbridos de enunciação científica, de alguma forma agrupados nas perspectivas pós-coloniais, trazem grandes polêmicas e enfrentamentos nas ciências humanas e sociais. O professor de sociologia da Universidade Livre de Berlim, Sérgio Costa (saiba mais),  apresenta um artigo bastante interessante refletindo sobre a temática. A publicação está disponível no SciELO (através da Revista BrasiImagem reproduzida do sítio http://www.cies.iscte.pt/destaques/nl.jsp?n=247leira de Ciências Sociais) e os caminhos para acessá-la estão arrolados abaixo.

Este ensaio discute as contribuições dos estudos pós-coloniais para a renovação das teorias sociais contemporânea. Considera-se, em primeiro lugar, o caráter da crítica que os estudos pós-coloniais endereçam às ciências sociais. Em seguida, discutem-se as alternativas epistemológicas que apresentam, considerando-se três concepções-chave – modernidade entrelaçada, lugar de enunciação "híbrido", sujeito descentrado. A conclusão é que, a despeito de sua contundência e da suspeita de alguns autores de que a teoria pós-colonial implode a base epistemológica das ciências sociais, boa parte da crítica pós-colonial tem como destinatário a teoria da modernização. Neste ponto, apresenta afinidades com objeções trazidas por cientistas sociais que nada têm a ver com o pós-colonialismo. Outros aspectos levantados pelos estudos pós-coloniais não desestabilizam, necessariamente, as ciências sociais, podendo mesmo enriquecê-las.

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