ABORDAGEM ARTESANAL, CRÍTICA E PLURAL / ANO 1 (16)

América do Sul, Brasil,

sábado, 21 de novembro de 2015

Kant, Iluminismo e moral


A máxima expresssão do pensamento Iluminista se encontra em Immanuel Kant (1724-1804), que, para além da Crítica da Razão Pura, escreveu Crítica da Razão Política e Fundamentação da Metafísica dos Costumes, nas quais desenvolve a sua teoria moral.

A razão prática diz respeito ao instrumento para compreender o mundo dos costumes e orientar o homem nas suas ações. Analisando os princípios da consciência moral, Kant conclui que a vontade humana é verdadeiramente moral quando regida por imperativos categóricos. O imperativo categórico é assim chamado por ser incondicionado, absoluto, voltado para a realização da ação tendo em vista o dever.

Nesse sentido, Kant rejeita as concepções morais que predominam até então, quer seja da filosofia grega, quer seja da cristã, e que norteiam a ação moral a partir de condicionantes como a felicidade ou o interesse. Por exemplo, não faz sentido agir bem com o objetivo de ser feliz ou evitar a dor, ou ainda para alcançar o céu ou não merecer a punição divina.

O agir moral se funda exclusivamente na razão. A lei moral que a razão descobre é universal, pois não se trata de descoberta subjetiva (mas do homem enquanto ser racional), e é necessária, pois é ela que preserva a dignidade dos homens. Isso pode ser sintetizado nas seguintes afirmações do próprio Kant: “Age de tal modo que a máxima de tua ação possa sempre valer como princípio universal de conduta”; “Age sempre de tal modo que trates a Humanidade, tanto na tua pessoa como na do outro, como fim e não apenas como meio”.

A autonomia da razão para legislar supõe a liberdade e o dever. Pois todo imperativo se impõe como dever, mas a exigência não é heterônoma – exterior e cega – e sim livremente assumida pelo sujeito que se autodetermina.

Vamos exemplificar. Suponhamos a norma moral “não roubar”:

  • para a concepção cristã o fundamento da norma se encontra no sétimo mandamento de Deus;
  • para os teóricos jusnaturalistas (como Rousseau) ela se funda no direito natural, comum a todos os homens;
  • para os empiristas (como Locke, Condillac) a norma deriva do interesse próprio, pois o sujeito que a desobedece será submetido ao desprazer, à censura pública ou à prisão;
  • para Kant, a norma se enraíza na própria natureza da razão; ao aceitar o roubo, consequentemente o enriquecimento ilícito, elevando a máxima (pessoal) ao nível universal, haverá uma contradição: se todos podem roubar, não há como manter a posse do que foi furtado.

O pensamento de Kant foi importante para fornecer as categorias da moral Iluminista racional, laica, acentuando o caráter pessoal da liberdade. Mas, a partir do final do século XIX e ao longo do século XX, os filósofos começam a se posicionar contra a moral formalista kantiana fundada na razão universal, abstrata, e tentam encontrar o homem concreto da ação moral.

É nesse sentido que podemos compreender o esforço de pensadores tão diferentes como Marx, Nietzsche, Freud, Kierkegaard e os existencialistas.

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofando: Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna, 1993. Página 285.

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