ABORDAGEM ARTESANAL, CRÍTICA E PLURAL / ANO 16

América do Sul, Brasil,

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Que tipo de República?

Bernardo Caprara
Sociólogo e Professor

Em 2018, a Constituição Brasileira em vigor completará 30 anos. Rasgada, amassada, assassinada, tornada fisiológica na vida prática. O Brasil parece que vive correndo atrás do próprio rabo. No dia 15 de julho de 1985, o saudoso professor Florestan Fernandes escrevia, na sua coluna em um jornalão desses oligopolizados, a respeito de qual seria o tipo de República que sairia da nova Constituinte e da transição “lenta, gradual e segura” pregada pelos militares. Quase três décadas depois, não deixa de ser impressionante a atualidade das suas considerações. 

“Os fatos mais clamorosos voltam a exigir definições claras, na teoria e na prática. Os coveiros da Independência e da República, os que tornaram impraticável qualquer forma precária e rudimentar de convívio cívico e democrático dentro da Nação, e através da Nação, retomam a linguagem do egoísmo cego e a ação desenvolta da violência dos que ‘tudo podem’. (...) São fatos que nos obrigam a abrir os olhos. Há uma guerra civil permanente e aberta em nossa sociedade civil. E é uma guerra sem quartel. Os privilegiados não abrem mão de nenhuma partícula de seus privilégios e brandem, por qualquer coisa, as armas brancas da degola e suas bandeiras ‘sagradas’, que põem a propriedade e a iniciativa privada acima de sua religião, de sua pátria e de sua família. (...) Sob a sua ótica, o que não coincidir com a intocabilidade da ordem estabelecida e todas as suas iniquidades é ‘comunismo’ e precisa ser banido de nossa terra! (...) A República teria de ser uma república de senhores, uma oligarquia perfeita, movida por interesses particulares absolutos e pela ideia de que o único ‘bem comum’ válido emana do comensalismo agressivo, secretado por aqueles interesses particulares” [1].

O título da esquecida obra de Florestan, que condensa os seus textos no jornalão oligopolizado, às vésperas da Constituinte de 1988, faz lembrar o que diz o filósofo grego Aristóteles sobre a justiça. Se decisões sobre justiça devem ser precedidas pelo debate acerca do objetivo das instituições sociais e sobre as qualidades dignas de valorização e reconhecimento, a pergunta do grande sociólogo brasileiro persiste: “Que tipo de República?”.

Referência

[1] FERNANDES, Florestan. Que tipo de República? São Paulo: Brasiliense, 1986. Páginas 75-76.

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