Bernardo Caprara
Sociólogo e Professor
Sociólogo e Professor
A semana vinha bem. Tatuagem nova, homenagem dos formandos, abraços
fraternos, proximidade das férias. Até que a morte bateu à porta.
Provável suicídio. Uma amiga distante, doutoranda numa universidade
estrangeira. Logo ela, a legítima expressão do Brasil praieiro: chiado
na fala, gingado, energia e alegria no DNA.
A vida é mesmo um
sopro. Difícil. Agora eu tomo um café, fugindo da solidão do
apartamento. Olho ao meu redor as pessoas que passam e que ficam.
Crianças e suas vidas ainda por fazer;
jovens adultos e suas carteiras vazias; adultos nem tão jovens e seus
cartões de crédito; velhos adultos e a nostalgia de um mundo que já
passou.
Seguro as lágrimas
no osso. Por quê? Não quero chamar a atenção. Não quero parecer
fragilizado. Por quê? Quem se importa? Penso nos incontáveis
trabalhadores que me cercam nesse instante. Em seus ofícios precarizados
e seus salários minúsculos. No seu tempo desperdiçado servindo, e
servindo, e servindo. Suportando a servidão. Vendo a vida passar em
troca de migalhas, para garantir ao menos a sobrevivência. Precária existência.
Mas, na real, alguém se importa? Quem se importa se a aluna do doutorado não segurou a onda, seja qual for essa onda? Quem se importa se eu ou você não aguentarmos a pressão? Quem se importa com as olheiras da empacotadora no supermercado? Com o olhar perdido do cozinheiro no restaurante e da vendedora na loja? Quem se importa se eles ou elas comem mal, dormem mal e vivem mal, tendo ou não recursos básicos? Quem se importa se as pessoas estão se rasgando por dentro, cuspindo as entranhas desses rasgos umas para as outras?
Difícil saber. Agora eu escrevo. Travo. Não quero escrever autoajuda. Foda-se. Escrevo porque me acalma. Desculpa aí, também detesto autoajuda. Escrevo para expressar. Escrevo pela memória de quem se foi tão cedo. Porque não dá mais pra apontar o barco para o horizonte e seguir impávido frente ao lixo que faz do oceano uma sólida imensidão vazia de significado.
Mas, afinal, quem se importa?
.
Mas, na real, alguém se importa? Quem se importa se a aluna do doutorado não segurou a onda, seja qual for essa onda? Quem se importa se eu ou você não aguentarmos a pressão? Quem se importa com as olheiras da empacotadora no supermercado? Com o olhar perdido do cozinheiro no restaurante e da vendedora na loja? Quem se importa se eles ou elas comem mal, dormem mal e vivem mal, tendo ou não recursos básicos? Quem se importa se as pessoas estão se rasgando por dentro, cuspindo as entranhas desses rasgos umas para as outras?
Difícil saber. Agora eu escrevo. Travo. Não quero escrever autoajuda. Foda-se. Escrevo porque me acalma. Desculpa aí, também detesto autoajuda. Escrevo para expressar. Escrevo pela memória de quem se foi tão cedo. Porque não dá mais pra apontar o barco para o horizonte e seguir impávido frente ao lixo que faz do oceano uma sólida imensidão vazia de significado.
Mas, afinal, quem se importa?
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