ABORDAGEM ARTESANAL, CRÍTICA E PLURAL / ANO 16

América do Sul, Brasil,

quarta-feira, 14 de junho de 2017

Oportunidades no lugar da vingança


Bernardo Caprara
Sociólogo e Professor

São impressionantes as reações ao episódio do suposto roubo de uma bicicleta e da punição dada ao suposto ladrão, por supostos tatuadores. Temos uma verdadeira guerra de narrativas sobre o assunto. Multiplica-se um “argumento” rasteiro que diz existir uma “inversão de valores” no país, porque muitas pessoas defendem que não se deve fazer justiça com as próprias mãos e é preciso ajudar a retirar a tatuagem da testa do suposto ladrão.

Biblioteca em Fogo, Maria Helena Vieira da Silva

Quem prega a justiça com as próprias mãos não percebe, mas, ao invés de fortalecer “valores morais”, enfraquece os mesmos, na medida em que seleciona quais seres humanos devem ser tratados como seres humanos e quais devem ser escorraçados. Fortalecer “valores morais” é tratar os infratores da lei, os viciados ou qualquer um como sujeito de direitos, como alguém que, mesmo tendo cometido um erro (quem nunca?), deve ter a oportunidade de se regenerar. Olho por olho e dente por dente não é justiça, é vingança. Se queremos uma sociedade menos violenta e mais fraterna, a forma como tratamos os “desviantes” precisa ser inclusiva, e não visceral, pois do contrário apenas alimentamos uma bola de neve macabra.

Em sociedades com “valores fortalecidos”, as bibliotecas, o contato com a arte, com os esportes, o aprendizado de ofícios e a oferta de oportunidades diversas são alternativas práticas de regeneração, capazes de fomentar um sentido diferente do que a violência para a vida das pessoas. A obra “Biblioteca em Fogo” (Bibliothèque en Feu, 1974, na foto acima), da pintora portuguesa/francesa Maria Helena Vieira da Silva, pode fazer pensar nos inúmeros horizontes que se abrem quando temos oportunidades na vida. É melhor trocar a porrada pelos livros.

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