Bernardo Caprara
Sociólogo e Professor
No dia 17 de julho de 2017, na UFRGS, defendi a minha tese de doutorado em
Sociologia, intitulada “Classes sociais e desempenho educacional no
Brasil”. Pouco antes do veredito final da banca examinadora,
considerando o trabalho aprovado e me atribuindo o título de doutor em
Sociologia, um filme de 12 anos e meio passou pela minha cabeça, da
primeira aula na graduação ao desfecho da pós. Na verdade, esse filme
vai mais longe. Lembrei o moleque introspectivo que via os pais
estudando nas horas vagas do trabalho,
batalhando tardiamente para completar um curso superior. Lembrei o
adolescente envergonhado, para o qual a escola era um baita problema, e
ao mesmo tempo o ponto de encontro diário com a única coisa que fazia
sentido: os amigos. Lembrei o jovem adulto que se dava conta de que o
Jornalismo não era a sua praia, mas que dali poderia tirar bons
ensinamentos. Lembrei o dia em que passei no vestibular para uma
universidade federal, um sonho que jamais havia sonhado. Lembrei o jovem
adulto encantado com as Ciências Sociais, lendo texto atrás de texto,
juntando trocados para comprar livros e sedento pelas pesquisas e
teorias que se lhe apresentavam. Lembrei o meu primeiro dia de aula como
professor, na querida Barra do Ribeiro, completamente inseguro, mas
cheio de vontade de fazer acontecer. Lembrei a proposta da minha querida
orientadora, Prof. Dra. Marília Patta Ramos,
na época em que entrei no mestrado, com o desafio de me dedicar a uma
formação metodológica rigorosa. Lembrei muitas outras coisas. As
alegrias. O amor. As festas. Os colegas. Os bons professores. Algumas
aulas. Os amigos. A galera nada a ver. Os almoços e jantas no RU. As
tristezas e sofrimentos. O antigo prédio de aulas do IFCH, assaltado
pelo imperialismo da Letras. A antiga Toca e os embates no Fla-Flu. O
CV. O Gnomos e a Estufa. A Hora Feliz. Cheguei até a lembrar das
Catacumbas! Diante de tantas lembranças, diante do encerramento de um
longo ciclo de 12 anos e meio, naqueles corredores do Campus do Vale,
naquele lugar em que vivi tantas emoções e cresci tanto, fui me dando
conta de que foi ali mesmo que comecei a gostar de estudar. Isso pode
não ser tudo, mas para mim foi um divisor de águas, transformou a minha
vida. E é por isso que continuo acreditando que a educação pública,
gratuita e de qualidade não pode ser um privilégio para meia dúzia. A
UFRGS vai me deixar saudades, mas a luta continua para que muitos outros
e outras tenham acesso a oportunidades que possam transformar vidas.
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