Bernardo Caprara
Sociólogo e Professor
Sociólogo e Professor
Por vezes, gosto de pensar na vida de cada um de nós como um livro. Deve ser porque gosto muito de livros. Se tudo der certo, e o meu livro tiver mais uns 20 anos de páginas, fico curioso para saber o que estará escrito sobre o domingo passado, 17 de abril de 2016.
Confusão, dúvidas e conflitos estarão presentes. A iniciativa de tirar uma Presidente da República, eleita com mais de 54 milhões de votos, em virtude de "pedaladas fiscais", vai ter um bom espaço. Mas não vão estar lá os parlamentares que detalharam o crime na tribuna, argumentaram com esmero o seu voto. Isso não aconteceu. De certo, lá estará escrito: "era um momento em que parte da população aderia ao lema de que os fins justificam os meios, e derrubar o partido no poder era o fim maior".
Ora, só isso não basta para preencher as páginas atuais do livro das nossas vidas. Vai ter que estar lá o absurdo de um parlamentar, eleito numa democracia, enxovalhando a própria democracia, elogiando um sujeito acusado de mil corrupções e defendendo a tortura de pessoas alheias. Os seus millhares de seguidores não serão absolvidos, mancharão as linhas dos nossos dias, estarão presentes como resquícios da barbárie. Tristes páginas serão essas, marcadas por dias difíceis, mas também por dias de resistência ao ódio e ao impulso de destruição.
Quero ter a chance de ler as páginas seguintes com mais alegria. Que os episódios narrados sejam de novos rumos, de bem menos desigualdades, bem menos violência institucionalizada contra mulheres, negros, pobres e homossexuais, trabalhadores e trabalhadoras. Com mais oportunidades e respeito. Cabe a nós a escrita dessas páginas.
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