Bernardo Caprara
Sociólogo e Professor
A greve, historicamente, é um dos principais instrumentos de pressão
dos trabalhadores. O conflito entre capital e trabalho constitui as
sociedades capitalistas. Por mais que os agentes econômicos possam
querer uma boa vida para todos, capital e trabalho possuem interesses
distintos. O capital busca maior rentabilidade; os trabalhadores querem
melhores salários e condições de trabalho.
De 1789 a 1917, da
Revolução Francesa à Revolução Russa, o capital ditava as regras das
relações econômicas sofrendo pressões pontuais, como a Primavera dos
Povos, em 1848, ou a Comuna de Paris, em 1871. As condições de vida dos
trabalhadores eram terríveis. Jornadas de trabalho de 16 horas diárias,
acidentes corriqueiros nas fábricas, crianças pequenas fazendo
atividades de adultos, mulheres grávidas trabalhando em contextos
insalubres. O capital apregoava um mundo de “liberdades”, no qual os
direitos trabalhistas eram entraves para o desenvolvimento.
Em
outubro de 1917, quando os camponeses e operários tomaram o poder na
Rússia, pela primeira vez quem vivia do suor do seu trabalho enxergava a
possibilidade de uma sociedade sem exploração de classes. Anos depois,
em 1929, a quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque desestabilizava o
capitalismo moderno. O Ocidente olhava para Moscou como uma ameaça real.
Logo viria a Segunda Grande Guerra e o populismo de extrema direita de
Hitler e Mussolini.
De 1933 até o final de 1970, de olho na
ameaça Soviética, o Ocidente capitalista se reinventava. Franklin Delano
Roosevelt, quatro anos após a Grande Depressão, iniciava as políticas
econômicas do New Deal, pelas quais o governo passava a investir
maciçamente em obras públicas, criava agências de regulação do mercado,
diminuía a jornada de trabalho, instituía o seguro-desemprego e outras
medidas para atenuar as mazelas dos trabalhadores estadunidenses. Era o
prenúncio do Estado de Bem-Estar Social, consolidado depois da guerra, a
partir das orientações de John Maynard Keynes. O Estado passava a
regular o mercado efetivamente, e a tributação subsidiava políticas
públicas e seguridade social.
O século XX, sociologicamente,
terminou em 1989. O fracasso da burocracia Soviética abriu espaço para a
dilapidação da estrutura de defesa dos trabalhadores no mundo
Ocidental. Um pouco antes, Margareth Thatcher, na Inglaterra, e Ronald
Reagan, nos EUA, aceleraram a desregulamentação financeira, diminuindo
impostos dos grandes empresários e fomentando o capital transnacional.
As cartas do “fim da História” estavam jogadas. Bancos, seguradoras e
grandes corporações dominavam as relações econômicas.
Em 2007, a
“crise do subprime”, empréstimos de alto risco e sem lastro, símbolo da
desregulamentação, jogava o capitalismo contra a parede. O Estado, mais
uma vez, entrava em cena e salvava banqueiros e empresários. Alguns
apressados anunciavam o começo de uma era “pós-neoliberal”. Só que a
Grécia, a Espanha, a Itália e muitos países seguiam sofrendo a pressão
dos credores para detonar direitos e implodir os serviços estatais.
De lá para cá, os rendimentos do capital cresceram e a desigualdade
também. É nesse cenário que as reformas colocadas goela abaixo no Brasil
estão inseridas: num contexto de ofensiva do grande capital. As
mobilizações de trabalhadores pelo mundo demonstram que esse jogo não
acabou. A nossa existência, a dignidade de um trabalho decente, essa
luta segue viva como há 100 anos.
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