ABORDAGEM ARTESANAL, CRÍTICA E PLURAL / ANO 16

América do Sul, Brasil,

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Gostar de estudar afasta a reprovação?


Os fenômenos adjacentes ao sucesso escolar podem ser ocasionados por distintos fatores. Do ambiente interno da instituição, observados os elementos familiares, até as próprias contingências das realidades específicas, perpassam muitas conjecturas, pesquisas e teorias. Sem entrar nessa seara, executaremos um exercício de porcentagens (sem muitos rigores metodológicos e teóricos, portanto não científico), tentando verificar algumas assertivas retiradas do cotidiano ou do senso comum.

A partir do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e o seu banco de dados de 2003, contendo 107 variáveis, será possível oferecer algumas reflexões. A proficiência dos jovens foi medida nas disciplinas de português e matemática e as demais variáveis constituem um questionário socioeconômico. As variáveis selecionadas são as seguintes: a) a reprovação dos estudantes (0=não; 1=sim), como manifestação simbólica dos seus rendimentos, no posto de variável dependente; b) o gosto pelo estudo (0=não; 1=sim), variável independente 1; c) posse de computador e internet em casa (0=não; 1=sim), variável independente 2.

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Os sinais dentro dos parênteses indicam a direção das hipóteses iniciais

A hipótese, baseada em uma percepção senso comum da realidade, é que os alunos que possuírem computador e internet em casa terão uma relação negativa com a reprovação, pois poderão acessar o conhecimento disponível na web. É lógico que a noção desconfiada, aquela que insinua que eles passarão seu maior tempo vidrados em jogos, redes sociais ou aplicativos de mensagens instantâneas não pode ser esquecida. Mas permaneçamos numa visão otimista.

Por outro lado, os estudantes com computador e internet em casa, nessa fantasia não muito reflexiva, iriam gostar menos de estudar. A internet os consumiria de modo quase completo. No entanto, aqueles educandos que gostam de estudar estabeleceriam uma relação negativa com a reprovação, porque o referido gosto os incentivaria aos melhores desempenhos. 
Sigamos para as tabelas:

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Disso tudo, podemos perceber algumas coisas. A média da diferença de porcentagens na Tabela 4, com relação à posse ou não de computador e internet em casa, é de -21,2 pontos percentuais. A média da diferença de porcentagens na mesma tabela, com relação ao gosto ou não pelo estudo, é de 3,9 pontos percentuais. Tais valores diferem pouco dos valores calculados sem a concomitância das variáveis (-20,9 e 3,2).

Não parece haver interação entre as variáveis. A relação entre possuir computador e internet em domicílio e gostar de estudar é positiva (4,8 pontos percentuais), desmistificando a ideia de que os equipamentos e o acesso a rede tirariam a vontade pelos estudos.


Sob outro prisma, a revelação mais interessante circunda o fato de que a presença de computador e internet nas residências dos estudantes diminui bastante a probabilidade de que eles reprovem. Diante disso, cabe ressaltar que o background familiar, tanto o econômico quanto o cultural, é um indicativo claro de impacto na redução das possibilidades de reprovação.

Finalmente, a ideia que se faz lógica numa percepção apressada, qual seja, que os estudantes com maior apreço pelos estudos tenderão a obter bons resultados (nesse caso, não reprovar) se mostra pura especulação. Frente aos dados empíricos, guardadas as limitações das estimativas estatísticas e a força pequena encontrada (3,2 pontos percentuais), os educandos que afirmam gostar de estudar carregam também uma tendência maior à reprovação. Ligado a isso pode vigorar certa confusão entre gostar da escola (socialização, colegas, etc.) e gostar dos estudos.

Bernardo Caprara
Sociólogo e Jornalista